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domingo, 5 de julho de 2020

Decotelli x FGV: ambos erraram!


Decotelli x FGV: ambos erraram!

Robson Matos



Acho que o episódio do Quase Ministro da Educação, Carlos Alberto Decotelli, nos apresenta a possibilidade de debatermos a precarização do trabalho, o descuido da FGV e os Programas de Pós-graduação brasileiros.

Inicialmente, entretanto, precisamos colocar algumas coisas em seus devidos lugares. Decotelli fraudou e continua fraudando o seu Currículo Lattes e ele é o único culpado em relação a isso. Não pretendo, pois, retomar esse assunto.


Em relação ao racismo sofrido por Decotelli, entendo que houve! Todavia, esse racismo não foi cometido pela sociedade e sim pela Rainha Louca. Conhecedor do fato de vários outros de seus Ministros haverem fraudado o currículo, o Presidente fechou os olhos e não os exonerou! Por que apenas Fraudatelli foi exonerado? Alguns dirão que em função de Decotelli ter sido nomeado ao cargo de Ministro da Educação torna uma fraude no currículo mais séria. Essa é uma meia verdade, uma vez que seus antecessores no MEC também fraudaram o currículo. Portanto, advogo a tese de que Fraudatelli foi exonerado por ter fraudado o Curriculo e ser negro. Posto isso, refuto completamente o discurso do Decotelli e da presidente da Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup), Elizabeth Guedes – irmã do Tchutchuca – que tentam justificar os erros cometidos por ele com base na sua negritude:

Há muitos brancos com imperfeições em currículo trabalhando sem incomodar ninguém” – Carlos Aberto Decotelli.

Quantos brancos já fizeram isso e não aconteceu nada?” – Elizabeth Guedes


Até certo grau, hei de concordar com ambos. Contudo, algumas ressalvas necessitam ser feitas. Primeiramente, não são inconsistências e sim fraudes. Vários brancos praticam o ato de maquiar seus currículos para que possam alavancar suas carreiras acadêmicas.


Sou obrigado a discordar do Fraudatelli! Existem vários casos de fraudes no Currículo Lattes, mas estão longe de serem comuns e para que esses casos parem de crescer, venho denunciando isso desde 2002. Essas fraudes levarão ao descrédito da Plataforma Lattes que serviu de modelo para inúmeros países no mundo.

Segundo o próprio Decotelli, sua demissão deveu-se ao fato da nota da Fundação Getúlio Vargas ter divulgado uma inverdade:


Mas, uma narrativa pode ser construída de acordo com o desejo de quem a faz. A nota da FGV – veja a íntegra a seguir – deixa muito claro que Decotelli não era professor efetivo. Em nenhum momento a FGV negou que ele tenha atuado como professor naquela instituição (destaque em vermelho).

“A FGV se encontra em regime de trabalho remoto, com aulas presenciais suspensas inclusive, desde março de 2020, por força do isolamento imposto pela pandemia do Coronavírus, seguindo determinação das autoridades constituídas, federal, estadual e municipal, em razão do estado de emergência de saúde.
O Prof. Decotelli cursou mestrado na FGV, concluído em 2008. Assim, qualquer informação a respeito demandará acesso a arquivos físicos da época pelos respectivos orientadores responsáveis, o que só poderá se dar após o retorno destes a atuação presencial, eis que todos pertencentes ao chamado grupo de risco.
Quanto aos cursos de doutorado e pós-doutorado, realizados com outras instituições educacionais, cabe a estas prestar eventuais esclarecimentos e não à FGV, para quem o Prof. Decotelli atuou apenas nos cursos de educação continuada, nos programas de formação de executivos e não como professor de qualquer das escolas da Fundação.
Da mesma forma, não foi pesquisador da FGV, tampouco teve pesquisa financiada pela instituição”.

Em tempos de disseminação de fake news, é fundamental que estejamos atentos e observemos ambas as narrativas. Ao fazermos isso, detectamos que Decotelli interpretou a nota pela ótica que lhe favorecia: “...de que eu nunca fui professor da Fundação Getúlio Vargas...”.

“A desgraça do esperto é achar que todo mundo é bobo”!

Gostaria de voltar à nota da FGV e peço-lhe que observe o trecho destacado em azul. De fato, não cabe à Fundação comprovar o título de Doutor e o estágio de pós-doutoramento, declarados por Decotelli. No entanto, era obrigação da FGV verificar a veracidade do suposto título de doutor apresentado por ele! Segundo Decotelli, ele atuava como professor em disciplinas do MBA – um programa de pós-graduação lato sensu – fato que não foi negado em uma nova nota da FGV. Vejo um trecho da nota (grifo nosso).

“A afirmação de que não era professor das escolas FGV se trata de simples rigor técnico inerente às classificações terminológicas das Portarias da CAPES, uma vez que não lecionava em turmas de graduação e pós-graduação stricto sensu, o que não reduz, em absoluto, a importância de tais cursos de educação continuada”.

E como Decotelli provou para a coluna do jornalista Guilherme Amado da revista Época, ele atuava no curso de MBA do campus de Duque de Caxias.


Não há dúvidas que ao divulgar a segunda nota, a FGV tentou disfarçar um erro em função da terceirização das atividades-fim. Ao que tudo indica, Decotelli é contratado como pessoa jurídica, ou através de uma empresa de terceirização, e assim sendo, a FGV terceirizou também a obrigação de conferir se o alegado doutorado do Quase Ministro tinha sido reconhecido no Brasil.

A FGV, portanto, pode ser acusada de enganar aqueles que se matricularam naqueles cursos que o Fraudatelli atuava como professor. Esses alunos acreditavam estar frequentando aulas ministradas por um doutor que não era.

O comportamento da FGV é grave e mostra a periculosidade da terceirização de atividade-fim. A Fundação contratou uma pessoa jurídica para se livrar de encargos trabalhistas e terceirizou a conferência da formação da pessoa física que iria atuar em seus cursos.

Decotelli foi massacrado, também, em relação à questão da ocorrência de plágio em mais de 70% da sua dissertação de mestrado, o que ele nega.



Em relação ao plágio, acho que o Fraudatelli está usando o discurso equivocado. Atualmente, existem inúmeras ferramentas tecnológicas capazes de comprovar a porcentagem de plágio em um trabalho. Portanto, é uma infantilidade insistir se foi 1% ou 70% ou, quiçá dentro da margem permitida. Fato é que houve plágio, e em qualquer grau é muito feio.

No entanto, acho que essa culpa não recai sobre o Decotelli e sim sobre seu orientador e a banca examinadora apontada pelo Colegiado de Pós-graduação da FGV. O papel do orientador é minimizar o número de falhas cometidas pelo seu orientado. Caberia, pois, a ele orientar o Decotelli, de maneira apropriada, como fazer a citação dos trabalhos de outros autores. Logo, houve falha por parte do orientador. Houve, também, falha da banca examinadora que não cumpriu o papel de fazer uma análise criteriosa e rigorosa da dissertação de mestrado do candidato. Como o orientador e os membros da banca examinadora não agiram de maneira correta, o Quase Ministro está passando por esse constrangimento.

É importante ressaltar que os Programas de Pós-graduação estão sofrendo com esse mal de orientação deficiente e bancas com pouco rigor acadêmico. Com a escassez de verbas para o financiamento, o aumento no número de doutores e uma pressão pela diminuição no prazo de conclusão dos cursos de pós-graduação stricto sensu, temos assistido a uma ação entre amigos nas defesas de dissertações e teses no Brasil. O que reina, em muitos casos, é a máxima de “aprove o meu aluno que eu aprovo o seu”. Essa prática é nefasta e já tem mostrado resultados muito negativos. Pesquisadores brasileiros já tiveram artigos científicos retirados de periódicos de grande prestígio internacional, após terem sido publicados e fraudes serem constatadas.


Por fim, volto à questão da narrativa do Decotelli sobre a nota da FGV. Ele não se cansa de insistir que teve a reputação destruída pela FGV:


Senhor Decotelli, não houvesse o senhor mentido em relação ao seu doutorado, nada disso teria ocorrido. Não teria havido contestação em relação ao seu estágio de pós-doutoramento, ninguém estaria falando de plágio e a FGV estaria muito feliz em ter um dos seus membros como Ministro da Educação.

E como uma dica, vos digo: não há nada mais nobre que o reconhecimento de um erro cometido. Mas, essa parece não ser uma prática da vossa pessoa. A autocrítica deve ser feita por e não pela sociedade ou seus críticos.


“A desgraça do esperto é achar que todo mundo é bobo”!

A se destacar, também, é o despreparo da grande maioria dos jornalistas brasileiros com relação à vida acadêmica. William Wack minimiza um problema de fraude no currículo classificando-o como “erro humano”. Mas, ele não para por aí e diz que Decotelli não conseguiu convencer o Presidente em relação a seu currículo. O Fraudatelli deveria, acima de tudo, ter convencido a si mesmo de que não era portador de um título de doutor e não ao Presidente e à sociedade.

Por fim, os erros foram cometidos por ambas as partes e não é possível colocar na balança para verificar quem errou mais, Decotelli e FGV erraram gravemente.

2 comentários:

  1. Se fraudou o currículo todo ou em parte, não serve para ser ministro da Educação, ficou sem credibilidade.

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  2. Boa reportagem sobre o assunto Decotelli. No meio da enxurrada de noticias, eu não tinha pensado na responsabilidade da FGV.

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