Pesquisar este blog

quinta-feira, 21 de maio de 2020

A Rainha Louca e a Militarização da Saúde


A Rainha Louca e a Militarização da Saúde
Robson Matos



O Ministério da Saúde conta hoje com 18 militares ocupando cargos de primeiro e segundo escalão, incluindo o Ministro interino, e, diga-se de passagem, não possui curso superior. Treze desses militares foram nomeados após a saída do Ministro Coveiro, nos dias 18 e 20 de maio. Dos treze indicados nos últimos dias, apenas um tem formação na área de saúde.

Durante o período da Ditadura Militar no Brasil – 1964 a 1986 – tivemos 10 Ministros da Saúde, dos dez apenas um não era médico. Todavia, não houve um único militar ocupando o cargo de Ministro.

Tudo começou quando o Presidente Francês – Emmanuel Macron – declarou que a luta contra o novo coronavírus era uma guerra. Vários outros presidentes mundiais e a grande mídia começou a se referir à luta contra a pandemia como sendo uma “guerra”.

Declarações desse tipo quando ouvidas por pessoas de pouca capacidade cognitiva levam a uma interpretação equivocada e essas pessoas tomam decisões errôneas em relação ao seu próprio comportamento. Foi exatamente isso que aconteceu na cabeça do Presidente da República. Ao ouvir o termo guerra ele logo tratou de trazer as Forças Armadas para o Ministério da Saúde. Em períodos de guerra, a logística é fundamental, portanto ele levou um especialista em logística para ser Secretário Executivo do Ministério da Saúde. Esse General, então, tornou-se Ministro interino e está transformando o Ministério da Saúde em um verdadeiro Quartel do Exército, ou se preferir, um “bunker”.

Em períodos de guerra é natural que os comandos militares não passem informações à população para evitar que o inimigo possa descobrir a sua estratégia de ataque. Por isso, não temos observado as imprescindíveis entrevistas coletivas com as quais havíamos nos acostumado na época do Mandetta.

Outra estratégia importante durante um período de guerra é a utilização de uma arma potente e, preferencialmente, que não esteja disponível para o seu inimigo. Usaremos um exemplo grotesco para fazer um paralelo entre uma guerra real e o combate a pandemia, que muitos estão chamando de “guerra” e, pelo que parece, o presidente não teve a capacidade intelectual para perceber que era no sentido figurativo.

A data oficial do fim da Segunda Guerra Mundial na Europa é o dia 8 de maio quando Hitler e seu exército se renderam. Todavia, a Guerra continuou no Pacífico e em uma tentativa de forçar a rendição dos japoneses, o Presidente Truman decide utilizar, para fins bélicos, o chamado Projeto Manhattan. Os EUA, então, lançam duas bombas atômicas – uma em Hiroshima e outra em Nagasaki – levando à morte imediata de 140 mil e 40 mil mortes, respectivamente. Além das mortes imediatas, muitas outras mortes foram observadas em função da radiação. Ou seja, sabia-se do alto poder destrutivo da bomba atômica, mas os efeitos colaterais futuros eram desconhecidos. O ato praticado pelos EUA foi condenado mundialmente, todavia, Truman nunca foi julgado e/ou condenado por genocídio.

Feito o paralelo, voltemos à guerra figurativa contra o novo coronavírus. O Presidente da República, motivado por motivos obscuros já comentados em outro artigo (veja aqui), acredita possuir uma arma poderosa – a cloroquina. Após várias tentativas frustradas de obrigar o ex-Ministro Mandetta a adotar um protocolo de uso da cloroquina ele o exonera. O Presidente usa a mesma tática com o ex-Ministro Coveiro, que também não aceita assinar um protocolo de uso indiscriminado da cloroquina. Afinal, com formação médica, tanto Mandetta quanto Teich sabem que os efeitos colaterais da cloroquina são muito mais devastadores que o seu poder de cura, que, aliás, ainda precisam ser provados cientificamente.

O Ministro Coveiro, então, sente que não conseguirá vencer a batalha e pede exoneração. O Presidente percebe que não adianta nomear um outro médico. Sabe que existe uma médica que é defensora do uso da cloroquina, mas é contra o fim do isolamento social. Logo ela não se encaixa no perfil desejado por ele. Sabe que a indicação de um médico terraplanista, que aliás esconde o seu último sobrenome – Plana – levará a um desgaste político muito grande. Ele decide, então, manter o General como Ministro interino. Passa a criar outras crises políticas para desviar atenção e começa a preparar o terreno para o uso indiscriminado da cloroquina no tratamento da Covid-19.

O primeiro passo do Presidente da República é a publicação de uma Medida Provisória – MP 966/2020 – que isenta agentes públicos de punição durante a pandemia. Em suma, se um agente público assinar um protocolo de uso da cloroquina, ele não será punido caso seja observado um grande número de mortes pelo medicamento. Da mesma forma, se um agente público prescrever cloroquina para um paciente e este vier a falecer por conta do medicamento, ele não será punido. A inconstitucionalidade da MP 966 está sendo julgada desde ontem no STF. Caso a MP não seja derrubada pelo STF ou pelo Congresso Nacional, os agentes públicos não serão julgados, exatamente como aconteceu com os responsáveis pela bomba atômica em Hiroshima e Nagasaki.

O Presidente da República sabe que um militar é treinado para cumprir ordens, embora ele nunca tenha cumprido e tenha sido expulso do Exército. Mas, o Ministro interino sabe que deve cumprir ordens e ele está em uma missão. Ele sabe, também, que mesmo o Presidente sendo apenas Tenente e ele General, o Presidente é o Comandante maior das Forças Armadas. Dessa forma, o Ministro interino ontem publicou um novo protocolo para o uso da cloroquina, exatamente como o Presidente queria. O mais absurdo é que o protocolo não foi assinado por médicos.

Vários aspectos ficam muito claros no interesse da militarização, não só do Ministério da Saúde, mas também de todo o Governo Federal. O Brasil tem hoje 9 dos 22 Ministérios ocupados por Militares. Um percentual maior – aproximadamente 40% – que a vizinha Venezuela – 29,4%. O atual Governo tem mais militares no comando de Ministérios que quatro dos cinco presidentes militares do Brasil. Médici, Geisel e Figueiredo tinham sete nomes das Forças Armadas e Costa e Silva que tinha 8 Ministros militares. Apenas Castelo Branco tinha mais Ministros oriundos das Forças Armadas – doze.

Discordo veementemente do que dizem vários políticos e analistas políticos sobre o fato de a Rainha Louca não ter um projeto. A Rainha louca tem um  projeto  pessoal e não coletivo.

O Presidente da República tem um projeto fascista. Dentro de um projeto fascista você precisa calar a imprensa, fechar as instituições democráticas e usar a força dos militares. Acredito eu, que as Forças Armadas brasileiras estão extremamente amadurecidas e seus Comandantes não irão “comprar” essa ideia lunática.

Restará, então, ao Presidente usar dos expedientes que ele usou por mais de 28 anos para se eleger. A utilização de grupos paramilitares para “tocar” o terror naqueles que se opuserem aos seus interesses e de seus familiares, ou seja, as milícias. O projeto do Presidente consiste em armar ainda mais as milícias cariocas e leva-las a todas as cidades brasileiras. Faz parte de seu projeto, também, armar os seus fanáticos seguidores.

É inacreditável que a Polícia Federal tenha sido capaz de prender um ex-Presidente da República, um ex-Presidente da Câmara, vários Governadores, vários ex-Ministros e, um sem número de políticos e seja incapaz de conduzir coercitivamente para depoimento o "desaparecido" Queiroz.

Não podemos nos calar e torna-se cada vez mais necessária a união de todos os Partidos Políticos que genuinamente defendem o Estado Democrático de Direito.

Nenhum comentário:

Postar um comentário