A volta da elitização do ensino superior
Robson Matos
Por décadas e mais décadas lutamos pela inclusão social nas
Universidades Públicas desse país. Dados divulgados pela Associação Nacional de
Dirigentes de Instituições de Ensino Superior (Andifes) mostraram que o
percentual de alunos de famílias com rendas até 1,5 salários mínimos matriculados
nas Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) saltou de 42,8% em 2003
para 70,2% em 2018. Além disso, o estudo realizado pela Andifes apontou que
60,4% dos estudantes nas IFES são oriundos da rede pública de ensino.
Dito isso, fica muito fácil compreender que a manutenção das datas de
realização do Enem deixara de fora das universidades no ano de 2021 a classe
mais carente da população. A chance de famílias com renda até 1,5 salários mínimos
possuírem um computador com acesso adequado à internet é mínima. Os estudantes
da rede pública de ensino serão extremamente prejudicados nesse processo, uma
vez que não terão a possibilidade de terem estudado todos os tópicos relativos
ao Enem.
A manutenção das datas do Enem não faz o menor sentido. Se bem que
nada vindo da cabeça do Ministro da Educação (ou Bobo da Corte) faz sentido.
Todos sabemos que “nunca na história desse país” as Universidades deixaram de
repor aulas por motivos de greve, por exemplo. Não será dessa vez que
deixaremos. É lógico que todos os semestres letivos estarão prejudicados e não
seguirão o calendário normal por no mínimo três anos. Ou seja, em 2021
estaremos cumprindo o segundo semestre letivo de 2020 e assim por diante.
Portanto, qual a pressa na realização do Enem, já que muito provavelmente esses
alunos entrarão nas IFES apenas no segundo semestre de 2021, na melhor das
hipóteses?
É imprescindível que não apenas o Enem 2020 seja adiado! O Enem dos
próximos 3 anos também precisa ser adiado. Não apenas os alunos do último ano
do ensino médio da rede pública serão prejudicados. Todos os alunos de todos os
anos do ensino médio do ensino público serão prejudicados.
O mínimo que se espera de um Governo responsável é capacidade de
planejamento do futuro. Em relação a esse quesito o Governo Federal tem se
mostrado totalmente incompetente, seja nas áreas de saúde, economia, ciência,
tecnologia, segurança pública e etc. Mais incompetente ainda tem se mostrado o
MEC. O Bobo da Corte tem se mostrado eficiente apenas em gerar polêmicas e
proferir palavras de baixo calão contra os Ministros do STF.
O Bobo da Corte parece viver em um mundo deslocado da realidade
brasileira. Desde o início da pandemia, a qual ele continua negando haver, ele
vem defendendo o ensino a distância nas IFES, tendo inclusive criado condições jurídicas
para tal. Muitos colegas docentes, também, defendem o uso de tecnologias para o
ensino à distância. Todavia, precisamos agir com muita cautela em relação a
isso.
O atual perfil socioeconômico dos estudantes matriculados nas IFES não
nos permite a utilização do ensino à distância em substituição ao modelo
presencial. Muitos de nossos alunos não possuem computador em casa e/ou
internet de qualidade para a transmissão de vídeos-aula. Há de se pensar também
nas aulas experimentais que serão prejudicadas com um ensino à distância. Tenho
certeza que alguns dos meus colegas têm defendido o ensino à distância durante a
pandemia mais por uma crise de ansiedade. Com 27 anos de experiência como
docente do ensino superior, já passei por inúmeros períodos com greves e
reposição de aulas. Desta vez não será diferente.
Assim sendo, para que possamos continuar avançando na inclusão social
nas IFES é fundamental que o Enem 2020 seja adiado. Mas, é preciso adiar também
o Enem de 2021 e de 2022. Sem isso, os estudantes do ensino médio das redes
públicas serão prejudicados.
Precisamos dizer isso em alto e bom som contra o Bobo da Corte. A cada
dia o Bobo da Corte demonstra desconhecer a realidade das IFES e até da
educação brasileira. Parece que a única coisa que o Bobo da Corte consegue
fazer bem é agredir verbalmente docentes, estudantes e Ministros do STF.
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